Eles eram 400 nas ruas de São Paulo, no primeiro sábado de dezembro, pedindo intervenção militar. Quatrocentos não é pouco. Um é muito
Quando escuto brasileiros fazendo manifestação pela volta da ditadura, penso que eles não podem saber o que estão dizendo. Quem sabe, não diz. Mas esse primeiro pensamento é uma mistura de arrogância e de ingenuidade. O mais provável é que uma parte significativa desses homens e mulheres que têm se manifestado nas ruas desde o final das eleições, orgulhosos de sua falta de pudor, peçam a volta dos militares ao poder exatamente porque sabem o que dizem. Mas talvez seja preciso manter não a arrogância, mas a ingenuidade de acreditar que não sabem, porque quem sabe não diria, não poderia dizer. Não seria capaz, não ousaria. É para estes, os que desconhecem o seu dizer, estes, que talvez nem existam, que amplio aqui a voz das crianças torturadas, de várias maneiras, pela ditadura.
Crianças. Torturadas. De várias maneiras.
Como Ernesto Carlos Dias do Nascimento. Ele tinha dois anos e três meses. Foi considerado terrorista, “Elemento Menor Subversivo”, banido do país por decreto presidencial. Foi preso em 18 de maio de 1970, em São Paulo, com sua mãe, Jovelina Tonello do Nascimento. O pai, Manoel Dias do Nascimento, militante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), organização comandada por Carlos Lamarca, havia sido preso horas antes. Ernesto é quem conta:
“Me levaram diversas vezes às sessões de tortura para ver meu pai preso no pau de arara. Para o fazerem falar, simulavam me torturar, com uma corda, na sala ao lado, separados apenas por um biombo”.
O menino de dois anos dizia: “Não pode bater no papai. Não pode”.
E batiam.
Continue a ler o texto aqui.
Leia também as reportagens sobre como Grenaldo Erdmundo Mesut descobriu o pai e o país. Numa pequena foto numa matéria de revista, ele encontrou o rosto desconhecido do pai – e um ex-militar reencontrou a face que o assombrava havia mais de três décadas. Com a revelação de um segredo, um filho soube, aos 35 anos, quem ele era.
Há três décadas morria a tecelã Maria de Lourdes, primeira mulher do futuro presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Maria de Lourdes foi vítima da mortalidade materna, que mata milhares de mulheres, todos os anos. Seu óbito foi assinado por um médico acusado de falsificar laudos de presos políticos assassinados pelo regime de 64
O filho do perseguido
Três décadas depois, ex-militar conta a verdade ao filho do marinheiro que sequestrou um avião da Varig e morreu
O fim de uma longa noite
O Estado reconheceu que o marinheiro Grenaldo de Jesus Silva, morto em 30 de maio de 1972 no Aeroporto de Congonhas, foi executado pelo regime