Big Brother sentia-se sozinho. O silêncio de seu mundo o oprimia. Enjoara de sua voz. Conhecia suas idéias sobre tudo. Não tinha nenhum pensamento que pudesse ocultar de si mesmo. Decidiu espionar a vida dos outros.
Foi mal interpretado. Um tal de George escreveu um livro denunciando supostas intenções nefastas. Ele gostou do estilo, mas não se achou bem retratado. Big não queria controlar o pensamento humano, não o interessavam as tiranias. Para isto, amestrava anões em sua ilha.
Big desejava desvendar as profundezas da alma humana. Investigar, camada após camada, a psique que havia inspirado Shakespeare, Dostoiévski, Proust, o cinema de Bergman e Tarkovski. Big tinha uma biblioteca maior que a do Mindlin. E um home theater de última geração, onde colocava a rodar sua coleção de blu-rays. E enchia-se de lágrimas, palpitações e — por que não? — ternura por aquelas coisinhas tão humanas.
Big, como quase todos os solitários, só queria conhecer gente. Se enturmar, ainda que incógnito. E foi com estas boas intenções e um coração batendo a 190 por minuto que se emparedou na Casa. Por causa de Big, aquela era uma casa onde as paredes pareciam respirar sem que fosse uma metáfora. Cheio de amor, ele começou sua observação pelo quarto. Mimetizou-se ao edredom de bichinhos, aguentando o cheiro de pum com estoicismo.
“Eu sofro muito, sabe. As pessoas não me veem como eu sou de verdade”, dizia o moço de tórax bonito para a mulher jaca. E, descontrolado: “Eu não sou só um tórax bonito!”. Aos prantos: “Eu também tenho umas coxas lindas e uma panturrilha desenhada e uma barriga tanquinho!!!”.
Big migrou para a piscina. Virou água com cloro. E, ops, um pouco de xixi.
“Isto aqui é um jogo, entende”, dizia a mulher com cara de conteúdo para o menino com piercing. “E eu vim aqui para jogar. O que me irrita são essas pessoas que ficam se fazendo de boazinha, dizendo que tanto faz. Eu sou sincera. Verdadeira, mesmo. Eu vou lá e digo o que penso. E falo na frente. Estou falando aqui para você, mas eu falo na frente.”
O menino do piercing roeu uma unha. Big roeu duas. “O que você tá falando, meu, você tocou num ponto aí…” Mas ela o interrompe, ou ele mesmo interrompeu a si mesmo, interrompendo uma reflexão que prometia. “Eu quero te contar que tipo de pessoa eu sou. Porque eu sou uma pessoa…”
Big mudou-se para a cozinha. Três cochichavam. Big, agora uma panela de pressão, apurou os ouvidos. A moça de cabelo verde dizia para a moça de óculos poá e para o moço com a camiseta o cu é meu e dou pra quem eu quero. “Eu vi que ele tá fazendo intriga contra nós. Ele tava cochichando com a loira… sabem de quem eu tô falando, né? Pois é. Aí, quando eu cheguei perto, pararam. Eu saquei, saca…”
A moça de penteado marciano sentou-se sobre a bancada da cozinha e a escumadeira desapareceu dentro da sua bunda. Big ficou agoniado, mas a panela de pressão já estava soltando vapor e achou melhor não se mexer. Ninguém pareceu notar. Nem ela. O moço com a camiseta do cu com atitude dizia agora: “Meu amor, a vida é dura. Duríssima. A verdade é que nós três somos fortes”. Silêncio dramático. Ele sentencia: “As pessoas querem sempre eliminar os fortes”.
Neste momento, a panela de pressão explodiu.
Big nunca mais viu ou foi visto.
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De volta à ilha, com queimaduras de terceiro grau pelo corpo, Big chorou no ombro de seu anão preferido.
Nunca mais viu ou foi visto.
2)
Big nunca mais viu ou foi visto. Alguns dizem que se dedica ao cultivo de tulipas na Holanda. Outros que se embrenhou na selva amazônica numa expedição para rastrear índios isolados que nunca retornou. Há quem jure que ele fez haraquiri no cérebro.