Ela estava grudada no teto. Ele bocejou. Hiiiiiii, ela emitiu. Do teto. Desça daí e vamos dormir. Amanhã você resolve isso. Hiiiiiiiiiiiiiiii, ela despejou na cabeça dele. Você não entende, não é? Eu sofro. A vida me dói. Meu maxilar está travado e também dói. Eu não consigo dormir sem meu remédio. Eu tenho tanta dor psíquica que tenho vontade de arrancar lascas da parede com as unhas. Ele suspirou. Não arranque, por favor, que a gente levou seis meses para acertar a cor que você queria. E, depois, se precisar pintar de novo, você vai ficar maaais estressada. Ela não acreditou. Ele estava mesmo fazendo uma piadinha, era isso?
Hiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii. Eu vou arrancar minhas tripas com as unhas, ela ameaçou. Ele esboçou um meio sorriso incauto. Me dá um minuto que eu vou botar um plástico para não estragar o colchão. King size, sabe como é. Hiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii. Maldito! Você não tem nenhum demoniozinho dentro deste corpo? Nem mesmo um bem pequeno? Você é oco? Agora ela estava ofendendo. Mesmo assim, ele abriu bem a boca enquanto escovava a língua e fingiu examinar seu lado avesso. Aparentemente nenhum, informou. Você é um nada, ela babou de ódio. Veio ao mundo a passeio. Nem sei como casei com alguém tão vazio.
Agora ele começava a se magoar. Vou dormir, avisou. Se você quiser continuar grudada no teto, fique. Só não caia em cima de mim, que você andou comendo muito chocolate neste mês…. kkkkkkkkkk. Hiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii. E o pior é que você ronca, ela reagiu. Eu tenho insônia e você ronca. Claro, não há nenhum demônio neste corpo, nem mesmo um demônio júnior pra te perturbar o sono. Odeio você! Splatch. Ela agora estava na cama. Ele se virou para um beijo de boa noite. Sexo agora nem pensar, né?
Hiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii. Eu nem estou a fim. Só estava pensando em você, ele disse. Para você dormir mais relaxada. Hiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii. Foi o último som dela naquela noite.
Quando o hipnótico dela fez efeito, o demônio dele deu uma cotovelada de leve em suas costelas. Mulher é um saco, né? Ele concordou, um pouco culpado por falar mal dela. Se apressou em dizer: Ela tem uns dias bons, não é sempre assim. Hum, fez o demônio. Sabe como é que a gente diz lá no inferno? Nem ideia, resmungou ele, sonolento. Acorda que é boa, cutucou o demônio. Diz aí, ele se resignou. Não bastava a mulher, agora o demônio queria papo àquela altura da noite.
A gente diz que “mulher é a parte chata da boceta”. Hahahahahahahahahaha. Era boa mesmo, ele concordou. Não é de minha autoria, eu preciso dizer, mas de um jornalista eminente que encontrei numa festa lá embaixo. Mas então no inferno não tem mulher?, ele perguntou, agora quase acordado. Nada, as mulheres vão todas para o céu. A boceta desce. Então, no inferno são só….? Só.
Hum…. foi o último som emitido por ele antes de dormir como um querubim.