Eliane Brum: “Na natureza, é impossível escapar do corpo. Nos reencarnamos em nós mesmos e nos reencarnamos como natureza na natureza”

A Vogue me pediu um texto sobre Banzeiro òkòtó. Aqui está.

Eliane Brum (Foto: Lilo Clareto / Divulgação)

Eliane Brum (Foto: Lilo Clareto / Divulgação)

“Caminho pela trilha de terra que leva ao rio Xingu, como faço todos os finais de tarde com meus cachorros, Babaju e Flora. Abro o portão azul da minha casa de roça, os cachorros disparam. Eu sigo devagar. Uso esse tempo para desatar a cabeça e buscar respostas que só encontro quando aceito perder o controle dos pensamentos. Naquele dia, eu buscava a resposta para este texto. Ouço então um latido diferente, algo agitou os cachorros. Pode ser um tatu ou um camaleão ou até mesmo uma paca. Ou uma jararaca ou coral, elas têm aparecido com as chuvas. Me apresso e então me deparo com o caminho barrado por um tucum, árvore da família das palmeiras. Tento encontrar um jeito de levantar o emaranhado de galhos porque quero passar. Mas tudo o que consigo é encher a mão de espinhos. Voltamos, eu e os cachorros, de repente roubados e perdidos. O rio está logo ali, mas já não podemos alcançá-lo. Mais tarde vou descobrir que o tucum era um cadáver recém-assassinado, o vizinho tinha aberto uma estrada e derrubado um pedaço da mata. Havia um mundo ali pela manhã. E à tarde já não havia mais. É assim que somem os mundos da gente. E somem as gentes do mundo.”

Leia o texto completo AQUI.

Rebeca aterrissa nas tripas de Borba Gato

Não acredito em superação. Acredito em políticas públicas. Sempre que se louva o indivíduo como produto de si mesmo, se enaltece o capitalismo que produz uma desigualdade tão abissal que nega à maioria das meninas negras a chance até mesmo de se alimentar de forma saudável. A narrativa da superação comete ainda uma violência adicional contra os já tão violentados, a de que poderiam ter sido Rebeca se tivessem se esforçado mais, a de que mães sozinhas, às voltas com o sustento e os filhos, aviltadas de tantas formas, teriam “produzido” Rebecas se tivessem se dedicado mais. Também por Rebeca e por tudo o que ela representa, porque representa, essa narrativa feita seguidamente em nome do bem precisa ser colocada abaixo como as estátuas dos assassinos. Não devemos usar Rebeca contra todas as Rebecas. Nem mesmo quando precisamos muito de boas notícias e de redenção.

(leia a coluna inteira no EL PAÍS Brasil)

A ginasta Rebeca Andrade depois de receber a medalha de ouro em Tóquio. LINDSEY WASSON / REUTERS (Reprodução do El País)

A ginasta Rebeca Andrade depois de receber a medalha de ouro em Tóquio. LINDSEY WASSON / REUTERS (Reprodução do El País)

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